O livro sobre o Medo
CARASSOTAQUE
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CARASSOTAQUE é um romance sobre o Medo. Seu entrecho e ação ocorrem num país imaginário em que seus habitantes perderam as cabeças e as suas faces por vergonha e medo, pelo terror de suas próprias ações e de suas limitações no local em que habitam. Ali o Judiciário acumpliciou-se ao grande poder econômico, ao sistema financeiro corrompido e aos ditadores de plantão, arrogantes, populistas e demagogos, agressivos ao meio-ambiente e à própria população. Um romance contemporâneo sobre o tempo atual de um mundo em decomposição, visto pelo olhar de um fotógrafo estrangeiro.
“A mesma problemática da procura da identidade num
mundo que nos convida a sermos ninguém me ocupa a
mim, enquanto escritor e cidadão.”
Mia Couto
“Portanto, um lugar isolado do mundo, mais ainda se
levarmos em conta que lá se fala uma inusual língua, o
português. O país passou ainda por uma cruel ditadura
militar, nos anos 70 do século passado, quando as
feições dos habitantes “começaram a desfocar-se” e, logo
em seguida, “houve o desaparecimento generalizado” de
suas cabeças.”
Luiz Ruffato
“No espelhismo de sua novela, Aquino utiliza um
recurso característico do texto alegórico: a simplificação
da escrita que aumenta e facilita a clareza da leitura;
que, ao mesmo tempo, conduz e induz facilmente o
leitor pelo estranho mundo descrito como se fora seu
próprio mundo, ressaltando a alegoria do texto e
impondo a reflexão (o refletir) entre o suposto e o
acontecido, entre o inventado e o não-inventado, entre
o que foi e o que poderia ter sido. Ele nos coloca diante
de imagens em que nos vemos, envolve-nos em situações
que nos comprometem, remete-nos a um incrível
mundo em que acabamos por acreditar - embora não
nos vejamos nele.”
Aldyr Garcia Schlee
“Copiar a realidade como se fora uma ficção. Uma
ficção de homens sem as cabeças e, mais grave, sem
os rostos. Mais grave porque, se não percebemos com
a razão, ainda poderíamos enxergar com a sensibilidade.
O medo e a necessidade de sobrevivência são causas
menores a essa anomalia de humanidade. Nunca se
justificarão os métodos escusos de exclusão. O genocídio
pátrio, num mundo burocrático e policial.
O livro é atualíssimo.
Ainda não saímos da ficção.
Ainda usamos máscaras.”
Maria Carpi
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CARASSOTAQUE
Cara, sotaque, identidade.
Enxergar a cara, entender o
sotaque, encontrar a identidade.
Atire a primeira pedra quem, na
face da Terra, desconhece um
desses três problemas. Quem
não tenha vivido, com mais ou
menos força, o império destas
necessidades: divisar a cara,
escutar o sotaque, viver a identidade.
Talvez tudo seja fruto do
Nacionalismo, essa forte ideologia
que a modernidade herdou
das antigas tribos e aldeias, dos
velhos reinos e clãs, e potencializou
como nunca antes, na
história humana, desbordando
do que era apenas circunstância,
agora transformada em fetiche.
De fato, faz uns quase trezentos
anos que vivemos encantados
debaixo desse manto, que encobre
diferenças enquanto aglutina
semelhanças - o Nacionalismo.
É ele que nos fez odiar
inimigos que poderiam estar ao
nosso lado, como amigos e
mesmo irmãos de viagem; mas,
paradoxalmente, é também ele
que nos faz ser minimamente
solidários com os que vestem a
mesma camiseta da seleção
nacional que nós - mesma cara,
sotaque parecido -, transformando-
nos em irmãos provisórios.
Nacionalismo, identidade,
cara, sotaque. Carassotaque.
É dessa matéria, dos fantasmas
dela, das loucuras que a ela
se associam, que Alfredo Aquino
faz sua primeira incursão na narrativa
longa.
Este CARASSOTAQUE que o
leitor tem nas mãos é uma
distopia, prima melancólica das
utopias antigas e recentes. Aqui,
um fotógrafo atuando no
estrangeiro enxerga o que os
nativos não vêem; e, sendo fotógrafo,
usufrui da grande virtude
do metiê, que permite compartilhar
o que vê com muita gente.
Gente que muitas vezes não
aceita enxergar o que o estrangeiro
enxerga - o estrangeiro
que estranha cara, desentende
sotaque, desembarca da fantasia
da identidade. O estrangeiro, só
por ser o que é, ajuda a ver mais
e melhor, e nem sempre os
nativos aceitam ver-se naquilo
que ele viu.
Difícil como discutir as alternativas
do mundo globalizado
de nossos dias, fácil como percorrer
uma exposição de grande
arte, o livro de Aquino ajuda na
reflexão sobre o que está aí e o
que talvez venha adiante. Com
sorte, aprenderemos a ver melhor,
aceitando o que o
estrangeiro viu que nós não
víamos.
Luís Augusto Fischer